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Journal d'une Femme de Chambre

Journal d'une Femme de Chambre

'vamos andando'

Por cá, os pensionistas* fazem jus à sua condição matam o tempo nas dunas observando os montes que se elevam no horizonte. 

A descontração que o facto de estarem na pensão, fora de casa, longe da sua realidade permite-lhes exacerbar a interpretação e descrição do que vêem.

Eu, para além do trabalho habitual, farto-me de limpar areia por estes dias.

 

 

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 ei-los como são. eis como se desejam

 

pen-si-o-nis-tas: Que ou quem vive numa pensão ou residencial, numa casa de hospedes ou num quarto pago em casa particular.

da minha ausência

Lamento que o entusiasmo dos primeiros dias me tenha deixado. Estes desabafos fazem-me bem. 

Venho, por isso, registar o meu compromisso de que tentarei ser mais regular nestes registos apesar da falta de tempo com que lido por estes dias.

A pensão está a abarrotar. Apareceu por aqui um moço que me dá uma trabalheira sem fim. Como é que um adulto pode dar tanto trabalho? É um moço estranho e ainda estou para perceber como é que suja tantas meias desaparelhadas...

Há muitos diários, este é o meu

'Journal d'une Femme de Chambre' é, para além do titulo do meu blog, o título de um livro do Octave Mirbeau que foi adaptado para cinema numa produção homónima dirigida por Benoit Jacquot. 

Célestine uma jovem criada, formada em Paris na arte de bem servir, tal como eu, é enviada para uma casa de província onde tem que lidar com uma patroa rígida e um patrão com mãos atrevidas. 

A minha história pouco tem a ver com a da Célestine que se move entre a necessidade de cumprir as suas obrigações e o sentimento de que tem de fugir da sua condição de pequena escrava.Eu não me formei numa dessas casas que agenciavam jovens e pululavam na Paris do século XIX, a minha formação foi obtida nos hotéis onde trabalhei, depois de deixar a minha primeira patroa e da minha menina as minhas condições de trabalho foram sempre diferentes (para melhor) das dela mas, compreendo a sua luta interior. Compreendo a sua dificuldade em abdicar de si para servir os outros, por isso, me identifico e adoptei o título para o blog. Por isso e porque também já tive a minha paixoneta por um rude jardineiro de pés cravejados de calos por causa das botas grosseiras...

 

 

ps Hoje a RTP2 passou o filme. Tem um guarda roupa horrivel, completamente desadequado e percebe-se que não foi alvo de grande investigação pelo que há anacronismos nos trajes e objetos que nos assaltam a vista a cada cena mas, é um bom filme, se ainda puderem, aproveitem.

Lê-se bem mas, lá que desafina, desafina

Eu que não gosto de ficar atrás do pessoal lá da pensão, gosto de estar por dentro das coisas dos livros e dos grandes escritores pelo que fui comprar um CD do Bob Dylan e estou agora a lê-lo.

Não percebo muito bem porque é que os senhores se queixam tanto e falam da leitura como um prazer doloroso. Estou aqui a ler de olhos fechados e não custa nada! Também não compreendo porque é que foram dar o prémio ao homem, continua desafinado, lê-se bem mas, lá que desafina, desafina.

 

 

Também tenho as minhas vaidades

Sou uma mulher como as outras. Gosto de me sentir apreciada.

Na pensão onde trabalho e que os senhores gostam de chamar de hospedaria vive um sujeito que frequentava a casa da minha anterior patroa, a dona Flor. É um senhor muito fino, mora no sótão e tem aquilo cheio de livros.

Sempre soube, pela forma como se comportava, que estava enrabichado pela dona Flor. Ela não lhe ligava. É uma senhora fina mas, muito isolada. Vive bem sozinha com os seus bichos. Uma ou outra visita dos vizinhos com pequenos mimos das hortas chegam para a fazer feliz.

Passávamos dias e dias sozinhas naquela casa, sem ver vivalma. Valia-nos o humor que era o que nos unia.

O meu nome é Maria Sexta-feira. Contavam os mais antigos que quando o bisavô de maman foi registar a minha bisavó lhe fizeram também o registo e como o chamavam Manel do Pinheiro, sendo que Pinheiro era a localidade e já existiam muitos Pinheiros (quase todos os vizinhos), foi instruído a escolher outro sobrenome. Como não estava preparado disseram-lhe - olha hoje é sexta-feira, ficas Manuel Sexta-feira e a tua filha Maria Sexta-feira. Ele que não era muito talhado para essas coisas e achou bem, desde então as Marias Sexta-feira sucedem-se. 

Quando fui trabalhar para casa da dona Flor, depois de tantos anos na França, trazia o sotaque característico dos emigrantes muito cerrado, a dona Flor achou-lhe graça e começou a tratar-me por Vendredi.

Mais tarde, contou-me um senhor das letras que esteve na hospedaria de passagem, o Senhor J. Eustáquio de Andrada , que Vendredi era o nome de um Índio que o Senhor Robinson Crosoé conheceu numa ilha depois de o barco onde seguia se ter afundado. O Senhor Robinson Crosoé que se sentia sozinho, na ilha a que chamou Speranza porque mantinha a esperança de sair dali, fez do Índio seu trabalhador e amigo. Achei apropriado porque eu também fiquei amiga da dona Flor sem perder a esperança de um dia sair daquela solidão.

Quero muito bem à dona Flor mas, sempre lhe invejei a admiração que os homens nutriam por ela. Pois, agora, estou feliz porque o tal hospede do sótão anda embeiçado por mim. Chamam-lhe Impontual, é muito elegante e parece que gosta de mulheres assim como eu, delgadas. 

Eu, sempre achei que o trabalho me tinha deixado seca mas, afinal há quem aprecie. Já me fez sua musa e tudo. 

Uma mulher não é de ferro, tenho as minhas vaidades e gostei de me sentir apreciada. 

 

Olá, também estou na bloga

Olá, sou a Maria e tenho ouvido os meus senhores falar tanto disto da bloga que resolvi experimentar.

Sou uma dedicada empregada doméstica formada nos melhores hotéis de Paris, na França, para onde fui aos 13 anos com maman. Lembro-me bem de maman me ter dito emocionada à entrada do comboio - minha querida vou dar-te um grande futuro na França, nunca mais vais ter que trabalhar... Dias depois estava a ajudar a Maria Enjeitada a limpar a casa de umas dames muito finas. 

Maman encontrou na França o que procurava, o João do Moinho. Andava por lá fugido depois de ter deixado o pobre Zé Manco maneta. Foi um acesso de raiva que o cegou a meio de uma discussão por causa de uma malga de vinho. Não era mau rapaz mas, gostava da pinga e andava por lá, no bidonville, aos caídos. Maman tomava conta dele e defendia-o - Coitadinho, ele se pudesse trabalhava mas, é tão fraquinho - dizia. 

Com três meses de França maman já estava grávida, não arranjava trabalho, alguém tinha que tirar sustento. A Maria Enjeitada era uma rapariga despachada que já estava na França há mais de cinco anos. Aprendeu a falar Francês com as dames que apreciavam a sua modéstia portuguesa, já estava na França como se estivesse em casa. Quando chegamos ela estava à nossa espera e disse a maman que uma das dames para quem trabalhava estava grávida e queria arranjar uma moça para ficar interna depois do bebé nascer. Já tinha tudo tratado. Começava aos poucos, com ela, nas limpezas ía aprendendo francês e quando o bebé nascesse mudava-me.

Era uma vida dura saíamos do bairro de madrugada para trabalhar. Um mês depois o bebé nasceu e eu mudei-me. A minha pequena Amelie... cuidei dela até fazer 4 aninhos, só a deixava ao domingo à tarde quando ía ver maman e os dois irmãos que entretanto me arranjou. Aprendi muito naquela casa, a madame tratava-me como se fosse da familia, pagava bem e deixava-me levar, para maman, as coisas que não serviam à menina. Saí por coisas que depois vos hei-de contar. Assim que saí, como o ordenado que entregava a maman completo faria falta, tratei de arranjar outro emprego, fui para o meu primeiro hotel. Daí até à pensão onde trabalho hoje muitas coisas se passaram.

As minhas amigas estão sempre a dizer que podia escrever um livro com as minhas histórias mas, já ouvi dizer aos meus patrões que isso é caro, como sou pobre e isto dos blogs sai de borla eis-me aqui.

 

 

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